terça-feira, 22 de março de 2016

Nove pontos para perceber o “negócio” dos refugiados



Envolvemo-nos, em Moçambique e no Malawi, durante pouco mais de uma semana a ver se entendíamos o burburinho à volta dos cidadãos ora concentrados no centro de Kapise, no Malawi, que sem provas, nem contagem independente, a ACNUR dizque são 10.668 moçambicanos.
Tentamos, nessa empreitada, acompanhar autoridades dos dois países para nos aproximarmos da realidade objectiva dos factos, bem como profissionalmente nos posicionamos, num exercício que nos levou aos seguintes pontos que podem ajudar a perceber o que está a acontecer.
Foi interessante saber que o campo de refugiados de Kapise não é novo. Já o foi durante a guerra dos 16 anos,movida pela Renamo, e até Junho de 2014 existiam 2000 pessoas, das quais, 246 eram moçambicanos, que as autoridades do nosso país dizem que haviam ficado por lá feitos meio-malawianos e meio-moçambicanos. Hoje ninguém diz onde estão estes. Quererá isto dizer que se juntaram aos actuais presumíveis 10.668 e será que somos proibidos de saber de que nacionalidades eram os 1754 restantes?
O ACNUR, mesmo em 2014, terá pedido que os 2000 refugiados em Kapise, fossem considerados refugiados moçambicanos, o que não foi aceite, por não haver, na opinião das autoridades do nosso país razões para que houvesse nacionais em tais condições, 22 anos depois de uma paz que se queria efectiva.
Informações em nosso dispor indicam que o centro de Kapise devia fechar até Junho do presente ano, por não haver justificação para a sua manutenção e havendo prioridades da Organização, noutras latitudes, em consequência da crise dos refugiados na Europa central e ocidental. É exactamente no período que antecede o fecho do centro que entra em cena a “fábrica de refugiados” moçambicanos para Kapise, que o ponto seguinte pode explicar melhor.
As hostilidades militares em Moçambique cessaram oficialmente em Setembro de 2014, mas a partir de Dezembro do mesmo ano se incrementam os ataques contra as FDS, no norte de Moatize, portanto depois das eleições. A reposição da ordem e tranquilidade públicas viria acontecer em Setembro de 2015. A última vez que foi disparado um tiro pelas FDS, na área de Nkondedzi, em particular, nas aldeias de Mondjo, Ndande, Macalauane, etc., para desalojar os homens armados da Renamo e desactivar os seus esconderijos em casas de alguns aldeões foi em Outubro de 2015. Mas a fuga em massa acontece neste ano quando dois fenómenos se anunciam: o encerramento do centro de Kapise e a governação da Renamo, a partir de 1 de Março corrente.
Oincremento de refugiados no centro de Kapise nunca foi notificado ao governo moçambicano pelo ACNUR, ate que, tal como outros, este soube através duma Imprensa seleccionada, que tratou de fazer um trabalho de reportagem, igualmente, selectivo, a quem se deu a instrução de não mostrar a cara dos entrevistados, facto que tem a seguinte logica: mostrando as caras, cedo se descobriria que a maioria das pessoas não era de Tete, mas sim, de Muxúngue e Maringué e de cidadãos malawianos, ou ainda saber-se-ia que os “refugiados” afinal são guerrilheiros que estiveram a montar as suas bases por aquelas regiões do norte de Tete.
O carácter selectivo da referida reportagem, que falava da fuga em massa de moçambicanos torturados pelasFDS (apesar de último tiro na região ter sido disparado em Outubro do ano passado), deixou dívidas nos professores que foram ouvidos a contradizer, já em Nkondedzi, que até agora estão à espera de ver publicados os seus depoimentos. Na verdade, é a reportagem que impressionou a todos atentos, para hoje concluir-se que se tratava duma encenação, que está a custar, entretanto, muito caro ao país.
Osobjectivos, porém, foram atingidos, designadamente (1) a ACNUR no Malawi não fechou, vai manter os postos de emprego que havia e, provavelmente, vai abrir novos, tendo para isso, valido a pena a mobilização feita no interior de Tete para que o número de pessoas aumentasse em Kapise (2), sendo que, por esta via, o ACNUR que já se tinha precipitado a pedir ao Malawi que os moçambicanos fossem declarados refugiados, a uma velocidade meteórica, com a mesma velocidade pede “ em principio” 15 milhões de Dólares, alegadamente para assisti-los, cujo número recusa que seja aferido pelos governos de Moçambique e Malawi ao mesmo tempo que pretende reabrir um novo centro, em Luane.
Aliás, já está em processo a transferência dos moçambicanos, de Kapise, distrito de Muanza, há escassos cinco quilómetros da linha de fronteira, para Luane, distrito de Neno, 60 quilómetros mais longe em relação à fronteira comum. Só pela transferência o ACNUR está já a pedir 2 milhões de dólares.
Aconspiração ficou completa contra o governo moçambicano, a partir, infelizmente, duma Agência das Nações Unidas, da qual Moçambique faz parte e cumpre com as suas quotizações, que tem que ser usadas contra si, com o uso duma imprensa dócil, numa situação em que o Malawi sai a ganhar, mas apresenta-se aparentemente inocente, na medida em que também não colabora para o esclarecimento definitivo do assunto, passando a mensagem de que também nada pode contra o ACNUR.
Éna verdade sintomático que tudo isso se faça à revelia do governo de Moçambique, que poderia e gostaria (não houvesse nada a esconder) de assistir os seus concidadãos, como o faz com os 269.192 também carentes por razões que não envergonham: seca severa, cheias e inundações.
Otempo a que se refere à violação dos direitos humanos, multiplica dúvidas quando se sabe que desde Outubro do ano passado, altura em que as FDS estavam a desmantelar as bases renamistas no norte de Moatize, não há confrontos militares, tendo ficado a accao silenciosa de caça aos secretários e outros elementos da liderança comunitária pró-governo, que a calada da noite são sequestrados para posterior execução ou convencidos a irem engrossar a lista dos “refugiados” no Malawi.
Oque é que a Human Rights Wacth, organização não-governamental de defesa dos direitos humanos, disse no relatório que produziu? Resposta: recomendou que o governo moçambicano investigasse com urgência as alegacões de execuções sumárias, maus tratos e abusos sexuais supostamente perpetrados pelas tropas governamentais. O que é que o governo fez? Resposta: urgentemente foi investigar e concluiu que não há evidências. Afinal, alguns sectores não atinaram com a confiança que a tal organização deu ao seu governo, gostariam que fosse doutra maneira, de tal jeito que tudo querem fazer para que se fabriquem evidências.
Por fim, esta semana, foi possível ouvir que “ a situação no terreno é explosiva”. Fica estupefacta a pessoa que esteve há três dias na região aludida, fica surpreendido quem esteve com o ministro Joaquim Veríssimo (e não são poucas pessoas), bem como devia escandalizar a quem o diz, tendo em conta que faz passar a mensagem de ter passado por Nkondedzi (distrito de Moatize) e Tsangano, mais encostado à fronteira do Malawi, do lado onde também se diz terem saído alguns moçambicanos ora em Kapise. A pergunta que fica é: chegaram a esses pontos escoltados, ou a ordem e tranquilidade é aquela prevalecente desde Outubro do ano passado, quando as FDS desactivaram os esconderijos?
Pedro Nacuo - Jornal Domingo

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